O que é intolerância à lactose?
A intolerância à lactose se caracteriza por uma reação não imunológica decorrente da baixa ou não digestão e absorção da lactose.
A lactose, por sua vez, é um carboidrato dissacarídeo composto por uma molécula de glicose e uma de galactose. Em situações ideais, após a ingestão de leite humano ou leite de vaca e derivados, a lactose chega ao intestino delgado e é hidrolisada nos monossacarídeos pela enzima lactase, presente nas células da borda em escova, principalmente no jejuno. Assim, após a hidrólise, as moléculas de glicose e galactose são absorvidas pelos enterócitos.
Em caso de alactasia (ausência de lactase) ou hipolactasia (deficiência de lactase), as moléculas de lactose não são digeridas e se acumulam no intestino, atraindo água para o lúmen, que culmina em aumento do volume e fluidez do bolo. Além disso, ao chegar no cólon, o conteúdo é fermentado por bactérias levando à formação de ácidos graxos de cadeia curta e gases. Esses efeitos podem levar ao surgimento de sintomas gastrointestinais desagradáveis, como dor e inchaço abdominal, flatulência, náuseas, diarreia e ruídos intestinais. Ainda, sintomas neurológicos podem estar presentes, ainda que raramente, como dor de cabeça, vertigem, desordens de memória, letargia e arritmia cardíaca.
A expressão de lactase na mucosa intestinal humana tem seu pico em 34 semanas de gestação e, desde o primeiro mês de vida do bebê, a atividade da enzima começa a decair. Esse processo é fisiológico e ocorre em aproximadamente 75% da população mundial. Entretanto, nem todos os indivíduos irão apresentar sintomas visto que uma redução de 50% da lactase ainda é suficiente para uma digestão adequada de lactose.
A hipolactasia pode ser dividida em três categorias:
A hipolactasia congênita é uma herança autossômica recessiva e tem como sintoma uma diarreia severa percebida desde a primeira ingestão de lactose na infância. É uma condição extremamente rara e persiste por toda a vida.
A hipolactasia primária também é uma condição de herança autossômica recessiva, decorrente do decaimento fisiológico da atividade da lactase, levando ao surgimento de sintomas como diarreia, inchaço abdominal e flatulência após o consumo de lactose. É bastante comum entre os indivíduos e as prevalências são maiores na Ásia, na África e na Australia.
Já a hipolactasia secundária é uma condição que surge quando há alguma lesão na mucosa intestinal decorrente de inflamações ou infecções, culminando em uma deficiência temporária da lactase. Entre as doenças, condições e eventos relacionados ao quadro estão doença de Crohn, doença Celíaca, colite ulcerativa, síndrome do intestino irritável, radiação, deficiências imunológicas, e principalmente infecções bacterianas, virais e de parasitas, e tratamentos com medicamentos. Ainda, uma condição conhecida como SIBO, ou supercrescimento bacteriano no intestino delgado, está relacionada a intolerâncias de açúcares e síndrome do intestino irritável. Assim, a intolerância decorrente de hipolactasia secundária é passível de reversão quando a condição primária é tratada e a mucosa intestinal é restaurada.
Dessa forma, na presença de sintomas de mal absorção de lactose, é necessário investigar se há uma hipolactasia primária ou secundária antes de seguir para o fechamento de diagnóstico. Enquanto a investigação se segue, é recomendado evitar ou retirar da dieta fontes de lactose, de acordo com a dose tolerada, visando o alívio dos sintomas.
Agora podemos voltar à pergunta inicial: Você é intolerante ou está intolerante à lactose?
A resposta virá após uma investigação por profissional qualificado, da história clínica e de possíveis quadros de doenças de base e condições como aquelas relacionadas à hipolactasia secundária. Caso seja encontrada alguma dessas, deve-se buscar seu tratamento e a recuperação da mucosa intestinal, pois a intolerância à lactose pode ser apenas temporária e de possível reversão.
Diagnóstico e Tratamento
O diagnóstico de intolerância à lactose, após exclusão de hipótese de doença de base e/ou recuperação da mucosa, pode ser confirmado com alguns testes, como teste oral, teste respiratório, e exames de sangue e urina.
Para o tratamento, recomenda-se evitar o consumo de leite e derivados, com reintrodução gradativa observando a tolerância, além de consumo junto a outros alimentos e fracionamento ao longo do dia. O diagnóstico correto é de extrema importância visto que a retirada de leite e derivados da dieta pode reduzir o consumo de cálcio, fósforo, outros minerais e vitaminas, nutrientes essenciais para uma vida saudável. Pode-se também fazer uso de reposição de lactase em forma de fármaco, sempre observando a aceitação e resultados para cada indivíduo.
Além disso, o uso de probióticos com cepas de Lactobacillus, Bifidobacteruim, Staphylococcus, Enterococcus e Streptococcus é conhecido por melhorar a digestão da lactose e, consequentemente, sua absorção.
Referências:
Branco, M. de S. C. et al. (2017). Classificação da intolerância à lactose: uma visão geral sobre causas e tratamentos. Rev. Ciênc. Méd., 26(3), 117–125. https://seer.sis.puc-campinas.edu.br/cienciasmedicas/article/view/3812/2630
Di Rienzo, T. et al. (2013). Lactose intolerance: from diagnosis to correct management. Eur Rev Med Pharmacol Sci, 17(2), 18–25. https://www.europeanreview.org/wp/wp-content/uploads/018-025.pdf
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