A constipação é um distúrbio gastrointestinal funcional que pode ser definido pela persistência da dificuldade ou irregularidade na defecação, assim como a defecação incompleta. Pode ser identificada utilizando diagnósticos baseados em sintomas, como no critério Roma IV, no qual se dá o diagnóstico quando dois ou mais dos seguintes sintomas se encontram em pelo menos ¼ das evacuações: fezes duras ou onduladas, sensação de evacuação incompleta, necessidade de forçar, necessidade de manobras manuais para auxiliar nos movimentos intestinais, sensação de obstrução anorretal, apesar de que a população em geral, assim como alguns médicos, consideram demais sintomas importantes no diagnóstico, como um longo período de tempo no banheiro sem conseguir evacuar. Pesquisas mostram que a constipação está associada a uma menor qualidade de vida e também a uma menor produtividade no meio profissional.
Também é considerada um problema frequente de saúde, sendo comum entre crianças e adolescentes, apesar de ter diagnósticos variados de acordo com os critérios utilizados para a sua identificação. O tratamento indicado é composto por intervenções em diversos fatores, como na alimentação, educação alimentar, desmistificação, uso de laxativos ou até o acompanhamento dos movimentos intestinais (evacuações) em diário.
Com relação ao tratamento da constipação, observa-se o crescimento da atenção à microbiota de indivíduos que sofrem da condição. Teoriza-se sobre a mudança da composição da microbiota intestinal em indivíduos com constipação devido à maior estase fecal no cólon, por exemplo, em estudos com adultos que sofrem da condição, observou-se divergências entre a microbiota destes e a encontrada no grupo de controle com indivíduos saudáveis que mostram que indivíduos constipados apresentam menor contagem de bifidobactérias e lactobacilos e uma maior concentração de bacteroidetes, porém os resultados são variáveis.
Existem diversos fatores que influenciam na motilidade intestinal, como o sistema imune, o sistema nervoso central e entérico, além do ambiente presente na luz intestinal (microbiota, fermentação e seus subprodutos).
Teoricamente, o uso de probióticos no tratamento da constipação em crianças e adolescentes pode ser justificado através de vários mecanismos que interagem com a microbiota em si e também com seus substratos, por exemplo, a produção de ácidos graxos de cadeia curta como substrato metabólico da microbiota podem melhorar a motilidade intestinal, através da estimulação de receptores na mucosa conectados aos nervos entéricos ou vagais, agindo direto na musculatura lisa do cólon ou pelo aumento da concentração do neurotransmissor serotonina, melhorando a motilidade e facilitando a evacuação, além disso a microbiota é essencial para o desenvolvimento do SNE (sistema nervoso entérico), que atua na regulação da motilidade intestinal.
Outro ponto positivo para o tratamento com probióticos é redução significativa nas dores abdominais quando comparados aos laxativos de acordo com estudos que compararam o uso de probióticos com laxativos osmóticos.
Estudos também observaram que a abundância de actinobactérias, Bacteroides, Lactococcus e Roseburia estão relacionados a um menor período de trânsito intestinal, enquanto Faecalibacterium foi ligada diretamente a um período maior de transito intestinal.
Porém a melhora da mobilidade não é o único fator a ser considerado para considerar um tratamento como sendo efetivo, um outro parâmetro seria a consistência fecal, isso sem considerar que alguns estudos realizaram tratamentos com probióticos associados a laxativos, porém esses medicamentos sozinhos já teriam efeito terapêutico no tratamento da constipação, logo a associação destes não deve ser ignorada.
Em estudos que interviram com probióticos não associados a laxativos, aqueles que relataram efeitos como maior frequência de motilidade intestinal, melhor consistência fecal, diminuição de dores abdominais e menor flatulência, não foi levado em consideração a constituição da microbiota dos indivíduos analisados antes e depois do tratamento.
Nesse contexto a própria informação é limitada quando o assunto é o perfil da microbiota em crianças e adolescentes que sofrem com constipação, onde diferentes estudos usam diferentes metodologias e tem seus focos em análises de espécies divergentes, além de certas pesquisas não levarem em conta variáveis como idade, IMC e dieta, tanto dos indivíduos sob análise quanto do grupo de controle para a comparação de dados obtidos.
Alguns estudos são inconsistentes quanto aos probióticos utilizados e a quantidade adequada, por isso é importante que mais análises desse tipo sejam realizadas para ajudar na segurança da utilização de probióticos em crianças e adolescentes com essa finalidade. Apesar dos vários pontos positivos encontrados para com a utilização de probióticos no tratamento da constipação em crianças e adolescentes serem muito promissores, os resultados das pesquisas são variados e até conflitantes, muitas vezes por conta das divergências entre as metodologias, focos dos estudos, cepas utilizadas, assim como suas dosagens. Além disso, alguns estudos apresentam resultados positivos, porém foram feitos em animais, ou seja, não são o suficiente para que seja feita a recomendação do tratamento em humanos. Porém com a maior atenção do público para o uso dos probióticos nesse tratamento, e até a maior utilização dos mesmos, com certeza será possível observar um maior aprofundamento no conhecimento nesta área, sendo muito importante a educação dos profissionais sobre a padronização dos estudos para que seja possível a obtenção de resultados concretos, para que assim o público geral possa ser educado sobre o assunto, e também guiado pelos profissionais de saúde até o tratamento mais adequado.
Saiba mais sobre o Microbiota intestinal em todas as fases da vida
com esse e-book exclusivo e gratuito!
Referências:
GOMES, Daiane Oliveira Vale San; MORAIS, Mauro Batista de. Gut microbiota and the use of probiotics in constipation in children and adolescents: systematic review. Revista Paulista de Pediatria, v. 38, 2019.
TABBERS, Merit M.; BENNINGA, Marc A. Constipation in children: fibre and probiotics. BMJ clinical evidence, v. 2015, 2015.
DIMIDI, Eirini et al. Mechanisms of action of probiotics and the gastrointestinal microbiota on gut motility and constipation. Advances in nutrition, v. 8, n. 3, p. 484-494, 2017.
DIMIDI, Eirini; SCOTT, S. Mark; WHELAN, Kevin. Probiotics and constipation: mechanisms of action, evidence for effectiveness and utilisation by patients and healthcare professionals. Proceedings of the Nutrition Society, v. 79, n. 1, p. 147-157, 2020.
Comments