Encontrar alguém que diz ser intolerante à lactose já não é tarefa muito difícil nos dias de hoje. Há pouco trouxe para vocês um conteúdo bem completo sobre o diagnóstico dessa condição, e para responder a pergunta que propus, vale lembrar algumas dessas informações importantes.
Vamos construir um raciocínio: existem diferentes fontes de carboidrato na alimentação, certo? Podemos encontrar esse macronutriente em frutas, vegetais, pães, massas… mas também em alimentos que possuem como ingrediente o leite. De fontes tão variadas, é lógico pensar que o carboidrato existe em diferentes formas. Uma delas, encontrada no leite, é a lactose: um tipo de carboidrato formado pela união de uma unidade de glicose + uma unidade de galactose. Nessa forma, temos uma estrutura bem grande, que não consegue ser absorvida pelas células intestinais se não sofrer uma quebra prévia. Essa quebra depende de uma enzima chamada “lactase”, que quebra a lactose em suas partes menores, que conseguem ser absorvidas. E aqui entramos mais fundo na questão desse post.
A deficiência dessa enzima pode ser total ou parcial. Pode ser uma condição que já nasce com a pessoa, ou que é adquirida ao longo da vida (e, na verdade, é normal que, com o avançar da idade, a produção de lactase diminua e a digestão da lactose fique cada vez mais difícil) ou, ainda, que acaba sendo consequência de alguma doença intestinal. Mas também existem pessoas que, mesmo sem serem intolerantes à lactose, restringem a sua ingestão e isso acaba fazendo com que percam a eficiência em digeri-la, mesmo sem nenhuma patologia presente.
A grande questão é que pessoas que são intolerantes à lactose acabam tendo um custo nutricional muito importante: a retirada de alimentos fonte de importantes nutrientes, como o cálcio, a vitamina D e proteínas de alto valor biológico. Não é possível aumentar a produção endógena (ou seja, pelo próprio organismo) da enzima lactase em pessoas que têm a sua deficiência, porém, é possível fazer com que sua microbiota trabalhe a seu favor!
É possível estimular um processo de “adaptação colônica”, no qual acontece o crescimento de bactérias que digerem a lactose no cólon, aumentando a tolerância individual. Essa adaptação é observada pela redução da produção de H2, gás resultante do processo de fermentação da lactose não digerida e/ou aumento da atividade de β-galactosidase fecal (enzima bacteriana que degrada a lactose). Essa mudança na composição da microbiota a partir desse processo de adaptação parece acontecer apenas em indivíduos com intolerância à lactose, e existem aqueles que respondem e aqueles que não.
Por isso, uma maneira mais segura e efetiva de promover essa adaptação é a partir da introdução dessas bactérias diretamente, através de probióticos. Certas cepas de probióticos têm demonstrado elevada atividade da enzima bacteriana acima citada, que degrada a lactose. São exemplos: Lactobacillus acidophilus W70, Lactobacillus acidophilus W22, Lactobacillus salivarius W24 e Streptococcus thermophilus W69. O que temos disponível na literatura hoje acerca do uso dessa estratégia para melhora da intolerância à lactose aponta resultados promissores, mas que precisam de reforço. É válido fazer a tentativa individual, mas sempre se atentando à concentração do probiótico e sua preparação, pois podem afetar a atividade da β-galactosidase.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Forsgård, R. A. (2019) Lactose digestion in humans: intestinal lactase appears to be constitutive whereas the colonic microbiome is adaptable. Am J Clin Nutr;00:1–7
Johnson, A. O., Semenya, J. G., Buchowski, M. S., Enwonwu, C. O. & Scrimshaw N. S. (1993) Adaptation of lactose maldigesters to continued milk intakes. Am J Clin Nutr;58:879–81.
Fassio, F., Facioni, M., & Guagnini, F. (2018). Lactose Maldigestion, Malabsorption, and Intolerance: A Comprehensive Review with a Focus on Current Management and Future Perspectives. Nutrients, 10(11), 1599. doi:10.3390/nu10111599
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