Vivemos em uma sociedade majoritariamente urbanizada e industrializada, com um elevado número de pessoas convivendo em um planeta que apresenta recursos limitados. Para dar conta da demanda alimentícia e de outros bens, mas principalmente para manter a sua hegemonia e lucro, as indústrias apresentam atividade e produção cada vez mais intensa, e isso apresenta um enorme custo ambiental - e também de saúde pública.
Essa enorme atividade produtiva é responsável pela geração de diversos tipos de contaminantes nas águas e no solo, o que, consequentemente, contamina a comida que ingerimos diariamente. Metais pesados e antibióticos são os dois principais contaminantes ambientais com impactos negativos no organismo humano. A inflamação e o estresse oxidativo resultante do acúmulo dessas substâncias podem prejudicar o funcionamento de diferentes órgãos, mas um deles, em especial, é mais afetado: o intestino. Além desses efeitos secundários, o intestino fica diretamente exposto a esses contaminantes pois é a porta de entrada deles no organismo.
Algumas medidas tentaram ser adotadas para “remediar” a contaminação no meio ambiente, mas os resultados foram desanimadores: a quantidade de área contaminada era exponencialmente maior do que a capacidade dos métodos de remediação ambiental poderiam alcançar. Então a atenção voltou-se para tentar descobrir maneiras de proteger o organismo humano contra os contaminantes e qual lugar melhor para começar se não o próprio intestino? Foi aí que percebeu-se que, da mesma forma que a microbiota intestinal pode ser prejudicada na presença de metais pesados e antibióticos, também poderia ser uma possível ferramenta de remediação da contaminação.
O que as evidências nos mostram é que a suplementação de determinadas cepas de probióticos é uma estratégia efetiva para a proteção contra a toxicidade induzida por esses contaminantes. Os Lactobacilli, por exemplo, se mostraram eficientes no alívio da toxicidade aguda e crônica causada por cádmio e pesticidas, redução do risco de diarreias induzidas por antibióticos, ao passo que também ajuda na recomposição da microbiota que pode sofrer disbiose devido ao contato com os contaminantes (que são capazes de alterar a composição e funcionalidade dos microrganismos para um perfil menos benéfico ao hospedeiro). Um exemplo de cepa específica usada em estudos com resultados promissores é a Lactobacillus plantarum TW1-1, mas ainda é necessário um maior corpo de evidências para outras possibilidades pois os efeitos parecem ser específicos, e blends de diferentes cepas talvez venham a ser mais efetivos.
E como essas bactérias atuam? O mecanismo proposto para essa atuação de gut remediation das bactérias intestinais é o seguinte: uma vez que são ingeridas a partir dos probióticos e conseguem se manter viáveis ao longo de todo o trato gastrointestinal até chegar ao seu destino, esses microrganismos se ligam aos metais pesados, diminuindo a sua capacidade de contaminar o hospedeiro. Além disso, algumas cepas parecem ser capazes de inibir competitivamente a absorção desses metais. Os probióticos também são responsáveis por:
aumentar a motilidade gastrointestinal, facilitando a excreção dos contaminantes;
servir como barreira de proteção para a mucosa intestinal;
e fazer a modulação da microbiota.
Dessa forma, diminui-se o acúmulo das substâncias tóxicas, especialmente os metais pesados, o que faz reduzir também o estresse oxidativo e os danos teciduais resultantes.
E é justamente disso que se trata o processo de gut remediation: a “remediação” de metais pesados (e outros contaminantes) no intestino, reduzindo a absorção desses compostos e evitando danos a outros tecidos do corpo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Feng, P., Ye, Z., Kakade, A., Virk, A. K., Li, X., & Liu, P. (2018). A Review on Gut Remediation of Selected Environmental Contaminants: Possible Roles of Probiotics and Gut Microbiota. Nutrients, 11(1), 22. doi: 10.3390/nu11010022
Wu, G., Xiao, X., Feng, P., Xie, F., Yu, Z., Yuan, W., Liu, P., & Li, X. (2017). Gut remediation: a potential approach to reducing chromium accumulation using Lactobacillus plantarum TW1-1. Scientific reports, 7(1), 15000. doi: 10.1038/s41598-017-15216-9
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